A mãe acocorada na calçada - crônica / Donald Malschitzky


Acocorada ao lado da filha de uns três anos, a jovem mãe, com calma e carinho, mostrava-lhe o sinal luminoso para pedestres do outro lado da rua. Não segurava a menina, somente conversava e indicava. Diminuiu o movimento de carros e a criança quis dar um passo, a mãe fez apenas um gesto de “espere” – e havia suavidade nele -, apontou novamente o sinal e ambas ficaram ali, aguardando a luz verde. Atravessaram a rua de mãos dadas. 

Quis estacionar para aguardar por elas e parabenizar a mãe. Não teve como, pois trancaria a fila de carros atrás de mim, mas ela bem que o merecia, pois, em tempos em que a educação passou a ser empurrada para a escola, a maioria dos pais parece mais preocupada em não respeitar as regras de trânsito do que em ensiná-las aos filhos.

A cena remeteu-me à minha infância, quando minha mãe insistia que eu olhasse para os dois lados antes de atravessar a rua, embora a passagem de um carro por aquelas bandas, naquela época, fosse quase um acontecimento. Foi uma daquelas mensagens que perdura não apenas por sua praticidade, mas pelo cuidado que encerra.

O que aquela mãe fazia não era apenas ensinar a filha a atravessar a rua com segurança: educava-a nos passos da vida. Regras podem ser impostas, mas a vida exige muito mais do que cumprir regras, e aprender isso significa educação. 

Quantas ruas, avenidas, caminhos veredas a menina ainda atravessará? Por quanto tempo haverá a mãe, de cócoras – porque mães devem saber se acocorar para ficarem do tamanho dos filhos – ao mesmo tempo, ensinando e dando liberdade para seguir os sinais, evitar os perigos evitáveis e enfrentar os necessários? 

Compreenderão ambas que os viveres são diferentes e essas diferenças podem se completar ou se chocar? Saberá a mãe sempre dar o sinal com calma e carinho e o aceitará a filha, confiante na experiência de quem já atravessou tanto mais? 

Serão os olhares sobre as feridas como bálsamo de empatia? E quando as estradas se transformarem em desfiladeiros, quem estenderá a mão forte? Será preciso apagar algumas pegadas deixadas por desperdício? Haverá tempo para aprender todos os sinais e saber que ainda é preciso olhar para os dois lados?

Pode tanto acontecer, mas o gesto ficará.



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